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  • Pedindo as juízes uma revisão de notas


    Como a maioria dos gymfans sabem, é permitido ao técnico do ginasta pedir uma revisão da nota que o atleta recebeu, caso este não concorde com a nota recebida. A única nota que pode ser revista é a nota D (nota de dificuldade), sendo que a nota E (nota de execução) é incontestável. Por isso é importante que o técnico tenha um profundo conhecimento do código de pontuação e da nota de partida do seu atleta, para que este não perca pontos preciosos que podem prejudicar a equipe e acarretar até na perda de uma medalha.

    Flávia Saraiva, por duas vezes recentes, teve sua nota D recebida abaixo do esperado e, analisando as séries, entende-se que ocorreu um erro por parte dos juízes. Entretanto, se o treinador / ginasta não percebe o erro ou não quer fazer o pedido de revisão, a nota é computada e nada acontece. Claro que a intenção não é colocar em cheque a integridade e honestidade do árbitro, mas se existe a possibilidade de um erro ter sido cometido (errar é humano!), é direito garantido no código de pontuação que o treinador peça a revisão da nota recebida.

    O pedido pode ser feito assim que o erro é percebido e antes da final terminar. Aconteceram inúmeros casos de ginastas que tiveram suas notas alteradas e uma medalha garantida nesses casos. O mais recente foi o de Sanne Wevers, ginasta holandesa na final de trave do Mundial de Glasgow, que acabou terminando com uma medalha (e teria terminado mesmo sem a revisão); Simone Biles na final de trave do Mundial de 2013. que iria sair sem medalha e, por conta da revisão, acabou com o bronze; e um dos mais polêmicos foi o de Kohei Uchimura (nesse caso em específico eu coloco a honestidade dos juízes em cheque), ginasta japonês que teve sua nota no cavalo com alças revisada na final por equipes dos Jogos Olímpicos, dando ao Japão, que nem ficaria no pódio, a medalha de prata.

    Agora vamos aos casos de Flávia Saraiva. Em nenhum dos casos o pedido de revisão de nota foi feito.

    Mundial de Glasgow - Solo - Classificatórias



    Elementos


    Pirueta e meia de costas (C) + dupla pirueta de frente (D) - bônus de 0.2
    Giro simples (A)
    Tsukahara grupado (E)
    Cortada em arco (C)
    Cadete com pirueta (D) - rebaixado para cadete com meia pirueta (C)
    Duplo carpado (D)
    Cortada com pirueta (D) - rebaixado para cortada com meia pirueta (C)
    Duplo grupado (D)

    Nota de Dificuldade

    Saída: D - 0.4
    Mínimo de 3 elementos de dança de maior valor: C + C + C - 0.9
    Maiores dificuldades da série: E + D + D + C - 1.6
    Bonificações: 0.2
    Requisitos de composição: 2.5
    Total: 5.6

    Com a nota de execução de 8.566, a nota final foi de 14.166

    Onde está o erro?

    Ao contrário do rebaixamento correto que houve no cadete com pirueta, o erro está na cortada com pirueta, que foi revalidada como C indevidamente. Segundo o código de pontuação da ginástica artística feminina, a posição dos ombros e quadris são decisivas na validação de saltos com giros, e ambos estão corretos (conferir minuto 1:17); na dúvida, árbitros são orientados a favorecerem sempre a ginasta. Com uma revisão de nota favorável a Flávia, sua nota D subiria em 0.1, o que daria uma nota final de 14.266. Essa nota colocaria Flávia como 2ª reserva do aparelho, à frente de Lieke Wevers, holandesa que acabou entrando na final desse aparelho depois da desistência da italiana Erika Fasana e da suíça Giulia Steingruber.

    Copa do Mundo de Ginástica, etapa de Baku - Trave - Final



    Elementos

    Flic (B) + layout (C) + layout (C) - bônus de 0.2
    Rondada (B) + mortal esticado rebaixado para mortal carpado (C) + salto sissone (A)
    Giro simples (A)
    Cortada (C) + split jump (A)
    Cortada em arco (E) + salto anel (D) - ligação não considerada, perde bônus de 0.2
    Mortal para frente (D) + wolf jump (A) - bônus 0.1
    Reversão sem mão (D) + reversão sem mãos (D) + mortal lateral (D) - bônus de 0.3
    Rondada (B) + duplo mortal carpado (E)

    *Nota: essa contagem dos elementos é a suposição mais óbvia de como os árbitros chegaram a nota de dificuldade esclarecida abaixo. Só seria possível ter certeza do ocorrido com a súmula dos árbitros em mãos.

    Nota de dificuldade

    Saída: E - 0.5
    Mínimo de 3 elementos de dança de maior valor: E + D + C - 1.2
    Maiores dificuldades da série: D + D + D + C - 1.5
    Bonificações: 0.6
    Requisitos de composição: 2.5
    Total: 6.3

    Com a nota de execução de 8.500, a nota final foi de 14.800.

    Onde está o erro?


    O erro está no rebaixamento do mortal esticado para um mortal carpado de valor C. Segundo o código de pontuação, o mortal de Flávia abre espaço para não valer E, mas não tem erros suficientes para ser considerado um mortal carpado. O correto seria que a ginasta tivesse seu mortal validado como D, o que aumentaria a dificuldade da série em 0.1 e também faria com que a ligação desse mortal com o salto sissone fosse considerada, aumentando a bonificação em 0.1. Com 0.2 a mais na nota de dificuldade, Flávia continuaria em primeiro, mas com uma nota final de 15.000.

    Independente da situação, sempre que houver dúvidas numa nota, como direito garantido no código de pontuação o pedido deve ser feito. Para se ter noção da importância disso é só lembrar do Mundial de Glasgow, onde menos de 5 décimos fizeram uma enorme diferença para a seleção feminina,que acabou não se classificando para as Olimpíadas e agora tenta uma última vaga no Evento Teste.

    Post de Cedrick Willian

    Foto: Ivan Ferreira / Gym Blog Brazil
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    6 comentários:

    1. especificamente no caso de Baku não valia a pena fazer o appeal IMO, já tava com a medalha garantida e de certa forma bota menos pressão nas competições seguintes.

      No Worlds eu realmente não sabia dessa possibilidade, vacilo hein!
      O brésil melhorou muito na composição das séries. Pé na cabeça+pé na cabeça é meio suicida e muitas vezes não vai ser validado mesmo se estiver correto.

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    2. Isso de a nota D da Flavinha vir abaixo do merecido já acontece desde os jogos da juventude em 2014, eu não entendo pra que um técnico monta a série de uma ginasta e na hora da apresentação ele não liga para o valor da partida que ela obteve. Brasil acorda, já foi uma final de solo perdida em Glasgow, quantas outras já ocorreram, quantas ainda vão ocorrer? Se isso vier a acontecer nas olimpíadas, vai todo mundo ver uma holandesa entrar na final de solo e o Brasil vai ficar chupando dedo?...

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    3. Olá Cedrick,
      Fiquei com uma dúvida em relação ao bônus da sequência de "dois rodantes sem mãos + mortal lateral" valer apenas 0,3.
      Não seria correto valer 0,4 já que 0,2 viriam da sequência de rodantes e mais 0,2 viriam da sequência do segundo rodante com o mortal lateral?

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      Respostas
      1. Por ser uma ligação para frente, sem rebote, a ligação de "reversão sem mãos" + "reversão sem mãos" (D+D) bonificação mais 0,1. E da ligação da segunda "reversão sem mãos" + " mortal lateral" (D+D) bonifica mais 0,1. O terceiro 0,1 fica por conta de ser uma ligação de 3 elementos, que bonifica mais 0,1, totalizando os 0,3.

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    4. Que matéria elucidativa, didática.
      Parabéns ao autor do texto.

      Lembrei da final da prova de paralelas das Olimpiadas de Pequim (2008). O pai de Nastia Liukin (seu tecnico) pediu a revisão da nota da filha, e Marta Kharoly recebeu uma sumula e foi conversar com ele concordando com a nota e aceitando a medalha de prata. Tem o vídeo no you tube.


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    5. Concordo com o comentario de que a ligação pé cabeça + pe cabeça é arriscada demais. E se não for validada não compensa.

      Melhor a flavinha tentar um salto arco com pé na cabeça isolado e conseguir a amplitude para validar o elemento com valor E.

      O Sheep jump a Flavinha poderia fazer depois de um salto TOUR JETE(C)...
      Iria ser plasticamente lindo...a sequencia TOUR JETE(C)+ Sheep Jump(D).

      Imaginem....o ideal seria a Flavinha....fazer o Salto cortada em arco validando (E) e depois....fazia a sequencia TOUR JETE(C) + Sheep Jump.

      Acredito que a série fica bem dinâmica...usando saltos com meia volta para mudar a direção da passada encima da trave.

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